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domingo, 14 de agosto de 2011

Rostos na Multidão


de Max Lucado
I
Dois tipos de pessoas foram tocados pela cruz: os tocados deliberadamente e os tocados por acaso. Entre estes últimos, são contadas histórias impressionantes.
A de Malco, por exemplo. Um servo do sumo sacerdote, ele estava trabalhando no Jardim. Todavia, essa busca de rotina teria sido a sua última se não tivesse sido rápido em desviar-se. As tochas iluminaram apenas o suficiente para que visse o brilhar da espada e Malco inclinou-se para trás o bastante para salvar seu pescoço, mas não a sua orelha. Pedro foi censurado e Malco recebeu um toque que o curou. Assim o incidente passou à história.
História, isto é, para todos, menos Malco. Se não fosse pela mancha de sangue em seu manto, ele poderia ter acordado na manhã seguinte falando sobre um sonho maluco que tivera. Alguns acreditam que Malco fez parte mais tarde dos crentes de Jerusalém. Não sabemos ao certo. Mas temos certeza de uma coisa: a partir daquela noite, sempre que Malco ouvia as pessoas falarem do carpinteiro que ressuscitou dentre os mortos, ele não zombava. De jeito algum; ele tocava no lobo da orelha e sabia que isso era bem possível.
II
Aconteceu depressa demais. Num minuto Barrabás estava na cela da morte, com os pés batendo na parede, e no seguinte foi solto; piscando os olhos por causa do sol brilhante.
"Você está livre."
Barrabás coçou a barba. "O quê?"
"Você está livre. Eles ficaram com o Nazareno em seu lugar."
Barrabás tem sido muitas vezes comparado com a humanidade e isso é certo. De muitas maneiras ele nos representa: um prisioneiro libertado porque alguém que jamais vira tomou o seu lugar.
Penso porém que Barrabás era provavelmente mais esperto que nós em um aspecto.
Quanto sabemos, ele aceitou sua repentina liberdade pelo que era, um presente não merecido. Alguém lhe atirou um salva-vidas e ele agarrou-o, sem perguntas. Não é possível imaginá-lo usando alguns de nossos truques. Nós recebemos nosso presente gratuito e tentamos ganhá-lo, diagnosticá-lo, ou pagar por ele, em vez de dizer simplesmente "obrigado" e aceitá-lo.
Por mais irônico que pareça, uma das coisas mais difíceis é ser salvo pela graça. Há alguma coisa em nós que reage negativamente ao dom gracioso de Deus. Temos uma compulsão estranha que nos leva a criar leis, sistemas, regulamentos, para nos tornar "dignos" de nosso dom.
Por que agimos assim? A única razão em que posso pensar é o orgulho. Aceitar a graça significa aceitar a sua necessidade e a maioria das pessoas não gosta disso. Aceitar a graça também significa que o indivíduo compreende o seu desespero e quase ninguém aprecia isso também.
Barrabás, porém, foi mais sabido. Perdido para sempre na cela da morte, ele não recuou ao ver-se libertado. Ele talvez não compreendesse a misericórdia e certamente não a merecia, mas não a recusou. Devemos procurar entender que nossa dificuldade não é muito diferente da de Barrabás. Nós também somos prisioneiros sem possibilidade de apelação. Mas porque alguns preferem continuar presos quando a porta da cela foi aberta é um mistério que vale a pena ser estudado.
III
Se é verdade que um quadro pode conter mil palavras, existe então um centurião romano que possui um dicionário cheio delas. Tudo que viu foi Jesus sofrer. Ele jamais o ouviu pregar, curar, ou sequer o seguiu através das multidões. Jamais testemunhou quando fez calar o vento; só testemunhou a maneira como morreu. Mas isso foi tudo que esse soldado gasto pela ação do tempo necessitou para dar um passo gigantesco de fé. "Verdadeiramente este homem era justo."
Isso diz muito, não é? Diz que o pneu da fé se encontra com a estrada da realidade nas horas dificeis. Diz que a autenticidade da nossa fé é revelada na dor. A sinceridade e o caráter se desvendam nos momentos de infelicidade. A fé é mais genuína, junto aos leitos de hospital, nas enfermarias para cancerosos e nos cemitérios, do que nas roupas bonitas dos domingos pela manhã ou nas escolas bíblicas de férias no verão.
Talvez fosse isso que movesse aquele velho e rabugento soldado. A serenidade no sofrimento é um testemunho estimulante. Qualquer pessoa pode fazer um sermão num monte cercado de margaridas. Mas só alguém de grande fé pode viver um sermão numa montanha de dor.

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